domingo, 20 de maio de 2012

O (grande) problema do clube


Parecem começar a emergir alguns sinais de que afinal uma saída da crise pode acontecer por outras vias que não pelas políticas irresponsáveis da chamada (pelos alemães e seguidores) "política responsável de dívida e deficit publico" dos países da eurozona, em especial da chamada periferia da eurozona. Pode muito bem estar a acontecer que as eleições gregos sejam um ponto de viragem: no fundo os gregos querem continuar no euro, mas não aceitam continuar a sofrer os efeitos das políticas depressivas de austeridade a longo prazo que lhes querem impor. E começa a ouvir-se que afinal pode haver maneira de conciliar as duas coisas e tornar os reajustamentos mais "socialmente responsáveis" e menos destruidores da sociedade e da economia. O meu palpite é que os eurobonds, ou instrumentos semelhantes de mutualização parcial de dívida na eurozona estarão de volta, na sequencia das eleições francesas, gregas e irlandesas.
Será muito interessante ver o resultado do referendo irlandês, em conjunto com o resultado das eleições gregas (primeira e segunda "volta"). E as evoluções das opiniões públicas de Espanha e da Itália nos próximos meses. Mas o que parece ser verdade é que se instalou realmente algum pânico em Berlim e Bruxelas quando se começou a perceber que as mensagens neo liberais dos tecnocratas financeiros estão a fermentar uma revolta nas urnas da europa meridional, e não só, e que afinal os gregos são mesmo capazes de quere bater o pé (e mesmo com a porta). Mesmo os partidos gregos pró-euro anunciam que pretendem renegociar as condições.
A intervenção recente de Durão Barroso começa a soar a patético: se a Grécia quer ficar no euro, tem que obedecer às regras do clube. Os gregos parecem estar a responder que se o clube quer que Grécia continue afiliada, então o clube tem que tratar a Grécia de outra maneira, mais de acordo com as políticas de governação do clube (que tem sido ignoradas) e com os objetivos de solidariedade do clube (também esquecidos).
Michael Pettis, um espanhol da Peking University’s Guanghua School of Management, e Senior Associate at the Carnegie Endowment for International Peace, faz uma boa discussão da posição espanhola, e conclui que (no cenário das políticas prevalecentes), a Espanha terá inevitavelmente que abandonar o euro por progressiva pressão da opinião pública. A leitura da newsletter, Europe's Depressing Prospects, recomenda-se. Embora se dirija ao caso da Espanha, o paralelismo com a Itália e Portugal é obvio. 
Pettis faz uma interessante análise da posição alemã, que será muito menos airosa do que parece e do que se pretende fazer crer:
  • Germany has a potentially huge debt problem on its balance sheet. As a consequence of its consumption-repressing policies during the decade before the crisis, Germany’s domestic savings rate was forced up to much higher than it otherwise would have been and Germany has had to export the excess capital. Not surprisingly, given European monetary dynamics, this capital has been exported largely to the rest of Europe in order to fund the current account deficits of peripheral Europe that corresponded to the surpluses Germany so badly needed to grow. 
  • It did this not by accumulating euro reserves, which it could not do anyway, but rather by accumulating loans to peripheral Europe through the banking system. As a result of all of these loans, Germany is rightly terrified that a wave of defaults in Europe will cause its own banking system to require a state bailout if it is not to collapse, and so it does not want to cut taxes and reduce savings because it believes (wrongly) that austerity will make it easier to protect its creditworthiness. 
  • But German’s anti-consumption policies are leading it towards a debt problem in the same way that similar US policies in the late 1920s created an American debt crisis during the next decade.
  • By refusing to take steps that seem on the surface to undermine its creditworthiness, Berlin will only ensure the debt moratorium that will probably demolish its creditworthiness anyway. 
  • I think Berlin is betting that if they can prolong the crisis long enough, while pretending that the problem is one of liquidity, not solvency, they can recapitalize the German (and other European) banks to the point where they eventually are able to recognize the obvious and take the losses.
Também a análise dos (inevitáveis) mecanismos de espiral recessiva das políticas de austeridade parece bastante clara nesta newsletter. Em particular a inevitabilidade de um desemprego insustentavel a longo prazo
  • unemployment must remain very high for many years so that wages either decline, or rise by less than inflation and relative productivity growth. This is pretty straightforward. 
A responsabilidade da saída da crise é de todo o clube, mas as implicações parecem ser insuportaveis para alguns membros do clube, ainda por cima com responsabilidades na crise:
  • The responsible thing to do is to acknowledge that the euro is indefensible and that Germany’s refusal to share the adjustment burden, after it absorbed most of the benefits of the mismanaged monetary position it imposed on the rest of Europe, means that Spain will be forced to take on far more than its share of the cost. 
As assimetria da poupança privada dentro do espaço intra comunitário e especialmente da eurozona, assim como da balança de comércio externo e da produtividade do trabalho são consequências de disfuncionalidades dos mecanismos da EU e do euro, que obrigam o clube a repensar-se. 
Pettis defende que a melhor opção para a Espanha é sair do euro, mesmo que isso seja inevitavelmente doloroso. Mesmo assim seria melhor do que ficar amarrado ao euro, à rigidez da eurozona (o tal clube de Durão Barroso) e a políticas irresponsáveis (as tais regras do clube de Durão Barroso).
É isto que é mesmo muito preocupante e um sinal que não se pode continuar a ignorar: depois de tantos esforços e sucessos na criação e implementação do sonho da Europa (UE), vozes responsáveis defendem que é melhor abandonar o clube e o sonho, tudo porque o clube parece estar a transformar-se num instrumento de liquidação do sul da europa pelo norte, e em especial por uma Alemanha reunificada, para quem o interesse do clube parece estar a desvanecer-se, ou mesmo a perverter-se. E nessas condições ficar no clube será (para a Espanha, como para Portugal ou Itália)  um suicidio assistido a prazo.

(Itálicos da nossa responsabilidade)

(Adição: por falar em clubes - uma foto notavel de atualidade, no inicio do post)

Sem comentários: