domingo, 1 de abril de 2012

Portos e ferrovias: desafios para Portugal

Um artigo no suplemento de Economia do Expresso, sobre a linha de mercadorias a alta velocidade (proxy anunciado do renegado TGV), confirma que afinal não há nem planos estudados nem ideias definidas sobre como a construir nem como fazer a sua integração com os planos ferroviários espanhol e frances.
O transporte de mercadorias é sem duvida importante, em especial em ligação com os portos nacionais. Mas atenção: Sines é nesse contexto muito importante - mas não se pode querer ligar só Sines e esquecer os outros portos nacionais, especialmente os do Norte.
Sines é especialmente importante na nova geografia das rotas transatlanticas, na sequência das alterações do canal do Panamá. Portugal pode ter aí uma grande oportunidade - mas terá aí também uma grande concorrência internacional, em particular dos vizinhos Espanha e Marrocos (pelo menos), se é que não está já mesmo atrasado na corrida.
Um artigo muito recente da edição impressa do The Economist (24 março 2012), integrado numa série sobre "building euro zone competititiveness" trata desta questão, em especial dos portos portugueses. O subtítulo antecipa a conclusão: "Portugal needs to privatise its ports to reap the full benefits of its location", como medida para baixar tarifas por aumento da concorrência entre os operadores portuários.
Sem prejuízo da importancia da ferrovia, o Governo será acima de tudo testado na sua capacidade de abrir os portos à concorrência e mesmo de os privatizar. Aí se verá a sua capacidade de realmente afrontar lobbies instalados e muito fortes (recorde-se o que aconteceu há uns tempos acerca de problemas numa empresa a operar no porto de Aveiro e os cinco dias de greve nacional que desencadeou). A recente visita do primeiro ministro a Sines (porventura sugerida pelo artigo do The Economist?) para anunciar generalidades e boas intenções é um ato político fácil. Vejamos como é que vai lidar com a realidade pura e dura dos interesses instalados nos portos nacionais.


O problema é que as ideias andam muito mais com as pessoas do que com as mercadorias. A ideia de que Portugal não precisa de transporte ferroviário de pessoas a alta velocidade é uma das ideias mais provincianas e emblemáticas da neoparolice lisboeta, na onde de cima pela mão da política ultra liberal do atual governo. São as pessoas que viajam e com elas as ideas, e através delas multiplicam-se as oportunidades de cruzamento de ideias, processo básico dos mecanismos sociais de inovação. A política anti TGV redunda numa política anti-inovação por não facilitar a mobilidade de pessoas e ideas num país com uma geografia excentrica relativamente ao espaço europeu (post anterior sobre o assunto, aqui).
O enorme impato que o comercio teve na europa dos fins da idade média e princípio dos tempos modernos deveu-se ao facto nas mercadorias não andarem sózinhas. Foram os transportadores que foram os agentes de inovação. Combóios com quilometros de mercadorias não são alternativa para a questão da inovação e das pessoas, sem prejuízo da sua importancia própria (nota: um porta contentores de ultima geração leva o equivalente a um comboio de mercadorias com 85 kms!).

Este artigo do The Economist recorda-me o meu amigo Henrique Neto, político que há muitos anos vejo a defender para Portugal políticas ferroviárias integradas com audaciosas ideias sobre portos de águas profundas em Portugal. Por isso lhe dedicamos este post, mesmo sabendo que nem sempre as nossas ideias sobre o TGV coincidem.

(Atualização, 2 Abril: o Público noticia hoje que "a linha de bitola europeia para Badajoz que o Governo quer construir não tem continuidade assegurada no outro lado da fronteira nem os operadores ferroviários a desejam" numa notícia entitulada "Passos anunciou linha ferroviária que não tem continuação em Espanha". Uma vez mais afinal as soluções que diziam ter e estarem bem estudadas e preparadas parecem não passar de fumaça.)

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